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Análise econômica do direito e os reflexos assimétricos nas relações contratuais durante a pandemia

Os impactos econômicos advindos da proliferação da COVID-19 não são mais novidade para os agentes econômicos. Já passamos da marca, aliás, de mais de um ano desde que a doença foi declarada uma pandemia pela Organização Mundial da Saúde, ainda em 11 de março de 2020 (OLIVEIRA et al. 2020). Ainda assim, apesar do tempo transcorrido, ainda vigoram estruturas profundamente assimétricas em algumas relações contratuais, o que põe em voga a necessidade de se discutir novos meios de contratar, ou de se ajustar contratos existentes, diante das incertezas sobre o futuro e da grande perda de faturamento de variados setores econômicos (SOUZA e SILVA, 2020). 

A exemplo dessa realidade de restrição e convivência social, podemos identificar facilmente um choque assimétrico na relação contratual entre um lojista e um Shopping Center, tendo em vista que centros comerciais já ficaram integralmente fechados e, até hoje, funcionam com horário reduzido.

Imagine um lojista que realiza contrato de locação de espaço, como por exemplo para a abertura de um restaurante na praça de alimentação de um determinado centro comercial, e que, diante das medidas de restrição social (fechamento ou redução de horário de atividade), viu-se obrigado a parar suas atividades ou adaptar suas vendas via delivery e drive-thrus.  Não é difícil imaginar que, com tão drástica queda de faturamento, o lojista poderá enfrentar dificuldades em honrar os seus compromissos financeiros firmados com a Instituição locatária. 

De modo a preservar este contrato, em virtude da existência de assimetria excepcional advinda dos reflexos pandêmicos, as partes envolvidas podem solicitar uma interpretação menos orenosa e mais flexível, visando à manutenção da relação contratual. É nesse sentido que, pelo fundamento principal da Análise Econômica do Direito, as partes envolvidas na relação contratual devem buscar soluções que sejam melhores para si, agindo de maneira racional, no intuito de evitar perdas para ambos os lados.

Durante a pandemia, ainda no ano de 2020, uma decisão da 7ª Vara Cível da Barra da Tijuca/RJ concedeu redução de aluguel ao lojista, incluindo suas cotas de condomínio e taxas de consumo. Se por um lado o magistrado considerou que não seria justo a isenção total das obrigações do lojista para com o locador durante o período de fechamento do Shopping, por outro reconheceu que tampouco é justa a manutenção integral das taxas de funcionamento. Afinal, as distorções de fluxo de caixa provocadas pela pandemia põem em especial risco setores com menor margem e mais sazonalidade, como o de varejo.

O magistrado, ao decidir o pedido de tutela de urgência, fez uma análise econômica do direito, ao ponderar que não cabe unicamente a uma das partes o prejuízo frente ao choque assimétrico advindo da Pandemia. Caberia, na verdade, a ambas as partes suportarem o ônus proporcionalmente, devendo o contrato ser reestabelecido ao seu estado natural após determinado período.

É nesse contexto que o Professor Fernando Araújo (2005) destaca que, num ambiente de escassez de recursos, é imprescindível fazer escolhas levando em conta seus respectivos custos de oportunidade; isto é, levando-se em conta os benefícios sacrificados ao se desconsiderar outras alternativas de resolução.  No exemplo citado, por exemplo, a ausência de reequilíbrio econômico levaria o locatário a entregar o espaço, custear a quebra do contrato, transferir sua empresa ou fechá-la. Ao locador, por sua vez, manteriam-se os custos básicos de manutenção do imóvel até que o mesmo fosse mais uma vez alugado, o que em si traz várias outras incertezas em tempos de queda de faturamento.

Ao solicitar adaptações contratuais diante de eventos exógenos que provoquem choques assimétricos numa das partes, pedidos de reequilíbrio contatual, fundamentados pela Análise Econômica do Direito, visam impedir efeitos não previstos no instrumento particular, mas que podem resultar em enriquecimento sem causa para uma das partes.

A flexibilização e consequente preservação da relação contratual tem como cerne, portanto, a maximização do bem-estar das partes, ou ao menos a minimização dos danos causados, diante de fatores excepcionais e temporários. O que se espera são soluções suficientemente satisfatória, sem que haja um desequilíbrio ou sobrecarga do ônus num dos lados do contrato.

Por fim, por se tratar de mero entendimento doutrinário, e não instrumento legalizado, não podemos considerar a Análise Econômica do Direito como adequada para quaisquer conflitos de âmbito contratual. Ainda assim, ressaltamos a importância de alguns contratos passarem por tal análise, de modo a preservar a relação entre as partes e a continuidade dos negócios afetados.

 

Referências

 

ALVAREZ, A. B., Análise Econômica do Direito: Contribuições e Desmistificações. Direito, Estado e Sociedade.  2006.

 

ARAÚJO, Fernando. Teoria Económica do Contrato. Coimbra: Almedina, 2007.

 

BRASIL. LEI Nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Lex: Legislação Federal, Brasilia.

 

Processo nº 0022536-57.2020.8.19.0209 –  7ª Vara Cível – Regional da Barra da Tijuca – TJRJ. Parte Autora: X-STYLUS CENTRO DE BELEZA LTDA. – Parte Demandada: MULTIPLAN ADMINISTRADORA DE SHOPPING CENTERS LTDA e outro(s) – Procedimento Comum – Enriquecimento sem causa. 

 

OLIVEIRA, W. K. et al. Como o Brasil pode deter a COVID-19. Epidemiologia e Serviços de Saúde, v. 29, p. e2020044, 2020.

 

SOUZA, Eduardo Nunes de. SILVA, Rodrigo da guia. Resolução contratual nos tempos do novo coronavírus. Disponível em https://www.migalhas.com.br/co- luna/migalhas-contratuais/322574/resolucao-contratual-nos-tempos-do-novo-coro- navirus Acesso em 05 abril 2020.

 

Artigo escrito por:

Pablo Ângelo Silva Gusmão Lins

Pablo Ângelo Silva Gusmão Lins

Advogado na Monteiro e Monteiro Advogados Associados
pablo.lins@monteiro.adv.br@monteiro.adv.br

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