Em junho do ano passado, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou procedente a ADI 5755, proposta pelo PDT para declarar a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e §1º, da Lei 13.463/2017.
O dispositivo mencionado determinava o cancelamento dos precatórios e das requisições de pequeno valor (RPVs) referentes aos montantes que estivessem depositados há mais de 02 anos em instituição bancária oficial. Após o cancelamento, proceder-se-ia com a devolução (transferência) imediata destes recursos para a conta única do Tesouro Nacional.
Diante deste cenário, litigantes e advogados em todo território nacional sofreram, injustamente, prejuízos advindos dos cancelamentos. Afinal, na maioria dos casos, a pendência para levantamento dos valores depositados dependia única e exclusivamente de provimentos judiciais. Ou seja, as partes interessadas nos levantamentos dos valores estavam, novamente, reféns da morosidade do judiciário.
Foi neste sentido que a ADI 5755 apontou diversas violações constitucionais, dentre elas o fato de que jamais caberia ao legislativo estabelecer uma nova condição, como prazo de validade, para o pagamento de precatórios. Outrossim, caso o legislador tivesse o interesse em fixar prazo máximo para levantamento de valores depositados, só o poderia fazer mediante edição de Emenda Constitucional – afinal, trata-se de alteração substancial na Carta Magna.
Frisa-se, sobretudo, que a aplicação do art. 2º, caput e §1º, da Lei 13.463/2017 caracterizava diretamente uma violação ao direito subjetivo outrora assegurado as partes interessadas por meio de sentenças transitadas em julgado, representando, assim, clara afronta à segurança jurídica, à garantia da coisa julgada e ao devido processo legal.
Pois bem, agora (26.05.2023), quase um ano após o julgamento de mérito da ADI, foram julgados os Embargos de Declaração opostos pela Advocacia Geral da União (AGU).
Nos embargos de declaração, a AGU requereu a modulação temporal dos efeitos da decisão, argumentando, em síntese, que a restituição dos valores cancelados e não recompostos entre o início da vigência da Lei 13.463/2017 (em 06.07.2017) e a publicação da ata de julgamento do plenário poderia comprometer a segurança orçamentária das políticas públicas em andamento.
Vale destacar que, segundo a AGU, o valor acumulado a ser recomposto chegaria a R$ 15,2 bilhões.
Ao analisar os referidos embargos, a relatora ministra Rosa Weber decidiu por modular os efeitos. Destacando que, por questões de segurança jurídica orçamentária e de interesse público excepcional, a decisão somente deveria produzir efeitos a partir da publicação da ata de julgamento do mérito da ADI. Além disso, a ministra reconheceu que a reativação imediata de requisitórios representaria um estado de instabilidade incompatível com o Estado de Direito.
Portanto, os requisitórios anteriormente cancelados não seriam imediatamente reativados, apenas aqueles que foram alvo de cancelamento após a data de publicação da ata de julgamento de mérito da ADI, qual seja 06.07.2022.
Contudo, restou pacificado que jamais caberia o cancelamento, pelas instituições financeiras, de precatórios e Requisições de Pequeno Valor (RPV) federais não resgatados no prazo de dois anos, tampouco a devolução automática dos valores para a conta do Tesouro Nacional.
Segundo a ministra, “não cabia ao legislador estabelecer uma forma de cancelamento automático realizado diretamente pela instituição financeira sem ouvir previamente a parte interessada”.
O voto da ministra Rosa Weber foi seguido pelos ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski.
O ministro Lewandowski frisou que a lei buscava resolver os problemas financeiros da União em detrimento dos direitos dos jurisdicionados. No mesmo sentido, a ministra Cármen Lúcia refletiu sobre a ausência de isonomia nas questões que envolvem o tema, tendo em vista que não eram dadas as mesmas ferramentas jurídicas ao Estado e aos cidadãos.
Por outro lado, os ministros Luís Roberto Barroso, Gilmar Mendes, Nunes Marques, André Mendonça e Luiz Fux foram vencidos. Estes votaram pela constitucionalidade do cancelamento dos precatórios e requisições de pequeno valor nas condições da norma em questão, desde que tal medida fosse precedida de intimação pessoal do credor.
Diante de todo o histórico, é provável que essa decisão do STF seja o marco final sobre a inconstitucionalidade material do art. 2º, caput e §1º, da Lei 13.463, estando pendente de esclarecimento, ainda, como e quando os valores já recolhidos aos cofres do tesouro nacional retornarão a quem de direito.
Sendo assim, considerando a essencialidade do tema e o significativo impacto da decisão no sistema jurídico brasileiro, é fundamental que os credores envolvidos nesse imbróglio acompanhem atentos o desenrolar da questão, observando a correta aplicação do julgamento e as possíveis implicações futuras.
Artigo escrito por:

Pedro Ferraz
Advogado na Monteiro e Monteiro Advogados Associados
pedro.ferraz@monteiro.adv.br

Caio Campos
Advogado na Monteiro e Monteiro Advogados Associados
caio.campos@monteiro.adv.br